Tuesday, August 16, 2011

Londres

Fui para Londres com a British Airways num voo nocturno e lembro-me de pensar que estava com medo de estar dentro de avião (como de costume) e que estava finalmente a ir em direcção ao sonho. Sentia borboletas no estômago e para me distrair fixava o olhar no painel que mostrava a rota por onde seguia o aparelho ou fingia ler a revista de fofocas que comprara no aeroporto da Portela.

Foi uma viagem dolorosa no sentido em que questionava-me o que sentiria, o que faria no país dos meus sonhos. E confesso não estar em mim quando pisei o famoso aeroporto de Heathrow e vi a minha queria amiga de há tantos anos à minha espera. Doente, mas de braços abertos para me abraçar, após quase dois anos de saudade.

Estava um frio de rachar. Sou amante do frio mas as baixas temperaturas inglesas fazem chorar as pedras da calçada e ao sair do aeroporto, o meu corpo e os meus ossos sacudiram numa espécie de orgasmo sobrenatural. As minhas primeiras impressões de Londres são nocturnas, cidade industrial, fria, densa.

Fiquei hospedada em Kilburn, bairro tipicamente inglês, recortado por árvores nuas e pacato, pelo menos até chegarmos à área de comércio. Ruas limpas. Pessoas vindas de todo o mundo. Alimentos coloridos e globais.

Deixei-me impressionar pela educação extraordinária dos britânicos. Não raras vezes ouvia excuse me, please, thank you, do you need help. Recordo o dia em que subia as escadas do metro carregada com a mala e fui abordada por um homem que me disse: "here, let me help you with that." O meu coração encheu-se de gratidão e sem pestanejar, entreguei a mala. Tivesse sido em Luanda e entregar a minha mala estaria fora de questão por causa da ladroagem. Tivesse sido em Lisboa e tal não teria acontecido, como pude comprovar duas semanas mais tarde.

Certa vez estava eu no supermercado e pus-me na fila para pagar numa das quatro caixas mas fiz um movimento qualquer que levou uma das funcionárias a dizer-me "miss, get back in the line, please." Respondi que estava na fila sem intenções de passar à frente fosse de quem fosse. Sou uma rapariga civilizada e gosto de respeitar o próximo, ao contrário do que se vê em Angola, nesta Angola tão maltratada e tão cheia de gente sem respeito pelos outros.

Bom, mas fiquei impressionada pela forma como se respeita o limite dos outros, como se organizam. Além disso, fui super bem recebida. Fui bem tratada nos autocarros, nas lojas (tirando aquelas geridas por indianos), nos restaurantes e nos bares.

Não explorei a cidade tão bem como gostaria, mas isso dá-me um bom pretexto para lá voltar. Não fiz tours pelos museus. Fui apenas visitar o Museu Victoria e Albert que apresentava na altura uma exposição riquíssima sobre a Ásia, fui ao Modern Tate onde caiu-me a alma ao chão ao ver uma obra de Diego Rivera (eterno amor de Frida Khalo). Vi a famosa Ponte de Londres e ao longe a sinistra Torre de Londres onde vivem fantasmas que deixaram este mundo sem tempo para orações. E claro, passeei o corpo por Picadilly Circus, pelo Soho, por Camden e ainda houve tempo para me encostar às grades do Palácio de Buckingham.

Mas o frio, senhores. O frio. Tive dias em que a mera hipótese de sair da quentura da casa climatizada era mais forte que a possibilidade de enfrentar o gelo que se sentia na rua. Ou que enfrentar a chuva miudinha que caía sem parar. Mas regra geral obrigava-me a sair pois que estava na terra dos meus sonhos e tinha de aproveitar.

Saí poucas vezes à noite mas entrei rápido na tradição inglesa do happy hour. Beber o máximo possível entre as 18h e as 20h que é quando a pinga está bem mais barata (tudo é caro na Londónia). Na minha última semana era essa a vida que eu levava. Misturar-me com os ingleses e a estrangeirada local e beber, não até cair, mas até estar com um sorriso de orelha a orelha. E entretanto aproveitava para falar com os estranhos que me aparecessem. Nunca me calhou um puro britânico. Eram egípcios, turcos, espanhóis e sei lá mais o quê. Crivava-os de perguntas: de onde vens, há quanto tempo cá estás, curtes morar aqui, planeias regressar ao teu país e blá blá blá. Perguntava por genuíno interesse. Queria saber as suas impressões da cidade e geralmente eram homens que eu abordava, mesmo correndo o risco de acharem que me estava a fazer à febra. Era mais fácil, sabem? Tinham mais abertura que as mulheres ou então sei lá, prefiro falar com homens.

Além de Londres, conheci a cidade de Bristol. Comparada com a capital é uma aldeia, mas ainda assim movimentada e com bares e restaurantes quanto baste. Bristol tem imensas universidades e por isso a maior parte da população é jovem. Ao contrário da Londónia, não se vêem muitos estrangeiros. Gostei da cidade e menos do frio que era bem mais agressivo. Para terem uma ideia, quando lá cheguei por volta das 21h, estavam menos de 10 graus.

Não posso dizer que apaixonei-me por Londres. Mas sentia-me atraída pela mistura de gente. Entrar no autocarro era como entrar no edifício das ONU. Gente de todas as raças, cada um falando a sua língua. E é disso que eu gosto. De uma cidade sem fronteiras, situada num mundo que se rege por fronteiras.

Paris

Viajei para a Europa em Janeiro deste ano a pretexto de um casamento. Tive que dividir bem o tempo: 15 dias em Lisboa, 15 dias em Londres e 3 dias em Paris. Mas na prática foram 15 dias em Lisboa, 20 dias em Londres (porque perdi o avião de regresso, sei lá, devia ser o subconsciente a dar-me a dica) e os 3 dias em Paris foram seguidos à risca.

Vou começar por esta última cidade. Paris, para quem está de férias, é o que se imagina, o que se vê nos filmes. É cidade antiga marcada por histórias seculares estampadas em cartões postais como o Louvre, a Basílica do Sacre-Coeur, a Torre Eiffel, Versailles e por aí fora.

Não é uma cidade opressiva, é aberta, melancólica. Para lá chegar cumpri o desejo ardente de viajar naquela maravilha da engenharia que dá pelo nome de TGV (Train à Grande Vitesse), o comboio espacial que rasga o Canal da Mancha a toda a velocidade (320 km/h). Graças ao comboio é possível fazer a rota Londres/Paris com comodidade, apreciar a transição da paisagem quando se entra num dos países e sai mais barato que o avião.

Lá chegada esperava-me o meu amigo francês que não via há dois anos. Assim que ultrapassámos a parte dos abraços, dos beijos, do ça va bien e da mala atirada para o quarto da pensão onde me instalei em Montmartre, fomos para a famosa Champs Elysée almoçar e lá vi gente de todas as cores e feitios, mas sem a homogeneidade que se vê em Londres. Fazia frio com sol e não pude evitar pensar que era uma sortuda do caraças por estar ali.

3 dias não são suficientes para conhecer Paris mas deu-me tempo para ver de perto o ex-líbris da cidade, ou seja a Torre Eiffel, para apreciar as margens do rio Sena e ver as casas flutuantes, passear por Montmartre e ver a Basílica do Sacre Coeur que fica nas imediações, apreciar o Arco do Triunfo com a sua homenagem aos que já partiram deste mundo e acima de tudo, realizar o sonho de flanar pelo Jardim das Tulherias e emocionar-me com a nobreza e com o peso histórico do Museu do Louvre.

É preciso que saibam que a História da França sempre me fascinou, então estar físicamente a passear pelo maravilhoso Jardim das Tulherias e respectivo Palácio e contemplar o Louvre enquanto absorvia a réstia de energia de tempos passados, foi como se tivesse nascido de novo. Espero que os franceses saibam a sorte que têm por terem tantos símbolos históricos. Parece incrível mas o meu amigo francês nunca lá pôs os pés!

Gostei muito da cidade e não tenho pontos negativos. A única chatice com que me deparei foi com o facto de ninguém naquela terra falar inglês, especialmente os jovens. Para comunicar, especialmente porque passei o segundo e terceiro dias sozinha, tive de ir buscar o palavreado que aprendi na escola, enferrujado pela falta de uso, mas bom o suficiente para me fazer entender e para entender os locais. Todos bastante simpáticos, especialmente quando viam que me esforçava para falar a língua deles.

Paris foi um desafio para mim em certo aspecto. Andei sozinha pela cidade, de autocarro e de metro - as estações de metro são horríveis, nada comparáveis às da minha Lisboa que são obras de arte - sem medo e satisfeita com a minha própria companhia, embora ligeiramente aborrecida por vezes. Cheguei à conclusão que não é assim tão mau, estar sozinha numa cidade estranha.

A cidade fez-me lembrar Lisboa graças às ruas calcetadas, às ladeiras, à antiguidade. Mas as semelhanças cessam por aí por motivos óbvios e que nem vou enumerar.

Gostava de regressar um dia à cidade-luz, mas por mais tempo e com mais dinheiro no bolso, pois a capital da França é bastante dispendiosa. Ficou muita coisa por ver, mas o que vi encheu-me as medidas.