Viver da arte tem muito que se lhe diga. E viver da arte em Portugal é pelos vistos uma tarefa hérculea. Passa-se a vida a bater de porta em porta com o portfolio na mão. A concorrer a concursos mil para ver se alguém descobre o talento que toda a gente vê, mas ninguém ampara.
E em tempos de crise como os que se vivem em Portugal, o artista tem de lutar a dobrar para descobrir o seu cantinho ao sol. Porque não pode viver da arte. Tem de relegar a sua arte para segundo plano porque a vida está realmente difícil e as portas fecham-se em catadupa.
Mas há aqueles que por um pedaço de reconhecimento nacional, abrem as pernas e o traseiro e vendem a pouca alma que lhes resta. Há os que se mantêm firmes na sua dignidade e preferem esmurrar as portas, até que se abram.
São muitos os membros das artes que passaram maus-bocados para sobreviverem do seu talento. Alguns morreram na penúria como Van Gogh, sem saber que décadas depois, os seus quadros valeriam fortunas. É a vida a troçar do sonho. Ou quem sabe, o sonho a esconder-se da vida.
"Como todos imaginam a arte é muito bonita mas não me paga as despesas nem alimenta as minhas muitas bocas (a não ser que me chame Paula Rego, Daniel Blaufuks ou Julião Sarmento, ou se tiver o bendito pai monocromático dos auto retratos aborrecidos de morte,ai que maldade a minha…) Étudo tãobonito: fotografia, dança, performance, desenhos, workshops, apresentações mas, quando vou ao supermercado fazer as compras do mês não é arte que troco por bens alimentares. Quando chega ao fim do mês e o dia dos pagamentos chega em forma de carta registada, não são fotografias que eu devolvo em resposta. Quando o frio aperta não são as fotografias que me aquecem. Já dei aulas, já passei fome, dormi na rua, já vendi colchões, bilhetes para a feira popular, já fui recepcionista, já trabalhei no circo,já servi em bares,dobrei roupa,vendi pizzas, fiz inquéritos de satisfação,vendi perfumes, artigos de decoração e livros. Já fui administrativa e também já fiz montras. Já fui desempregada e fui fotógrafa e jornalista.
Ps.também já fiz voluntariado,onde zelei pela defesa da floresta em época de incêndios e dei apoio a crianças orfãs numa instituição da qual não me recordo do nome.
Ps2.Por acaso agora me lembrei que nunca fui nem segurança,nem prostituta, nem doméstica.
Isto para dizer o quê?Que, quem me quiser oferecer trabalho que não hesite. Qualquer coisa será melhor do que ser tratada como uma anormal numa caixa de supermercado. Também sei fazer o pino e a esparregatae faço vinte piscinas olímpicas em meia hora. E apesar dos 30 anos,o que significa ter ultrapassado o prazo de validade(é o que o povo diz por aí:”só até aos 25 anos”),garanto encontrar-me bem conservada (como uma sardinha enlatada e enrolada numa magnifica tomatada picante nacional), ainda consigo articular tanto palavras e raciocínio como membros."
Cátia Cóias
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